A Guardiã de Pedras: Fantasia, Dragões e Analogias Cristãs – Uma Análise Teológica

“A Guardiã de Pedras”, de Cristina Bomfim, não é apenas um livro de fantasia épica. É uma obra classificada como “Ficção Cristã” que utiliza um mundo de dragões e clãs para traçar profundas analogias com a fé. A própria autora, Cristina Bomfim, nascida em Curitiba/PR e formada em Comunicação Social, afirma que suas crenças e princípios são expressos através da magia em seus livros, embora não haja uma menção direta a uma denominação religiosa específica. No entanto, o tom e os temas abordados ressoam fortemente com a teologia evangélica/protestante.

Vamos mergulhar nos pontos de contato e nos aspectos que geram debate entre o universo de Ekrateia e a Teologia Cristã.

Pontos em Comum: As Grandes Analogias da Fé

O sucesso da obra reside em sua capacidade de traduzir verdades bíblicas complexas em elementos narrativos envolventes.

1. A Divindade Soberana e a Criação

No princípio da história, é apresentada a “Chama Eterna”, de onde nascem os nove Dragões Originais, que, por sua vez, dão origem aos clãs e a toda a vida no mundo.

  • Analogia: A Chama Eterna é uma clara representação do Deus Criador Único da Bíblia, a fonte de toda a existência. Os Dragões Originais funcionam como os seres criados que estabelecem a ordem e concedem dons, refletindo a Soberania Divina sobre o universo. A existência de Dragões com domínios como “mansidão”, “paz” e “fidelidade” sugere que os próprios fundamentos do mundo foram estabelecidos com base em virtudes divinas (análogo aos Frutos do Espírito e às qualidades de Deus).
2. A Queda e a Distorção da Ordem

O mundo dos clãs é marcado pela rivalidade, pela segregação e pelo preconceito contra os “mestiços”. O sistema que Maila deve proteger é disfuncional, cheio de segredos e ameaças.

  • Analogia: Essa realidade disfuncional é um espelho do conceito da Queda do Homem (Pecado Original). A divisão entre os clãs e a intolerância são manifestações do pecado que corrompe a harmonia original da criação de Deus. A jornada da protagonista para restaurar a ordem e lidar com segredos antigos simboliza a busca pela redenção e a luta contra as consequências do erro.
3. A Luta da Lei e a Necessidade de Graça

A protagonista, Maila, pertence ao clã do “domínio próprio” e está sob o fardo de ser “impecável” como filha, guardiã e futura esposa, uma expectativa que ela tenta cumprir “Todos os dias”.

  • Analogia: Maila personifica o Legalismo ou a tentativa humana de alcançar a justiça (salvação) por meio de esforço próprio e obediência estrita à lei. Seu sofrimento sob o fardo de ser impecável ilustra como a Lei, sem a intervenção da Graça (o que normalmente é desenvolvido em Fantasias Cristãs), é pesada e impossível de ser totalmente cumprida pelo ser humano.
Pontos de Debate Teológico: Alegoria vs. Literalidade

Ao usar a fantasia, a autora emprega elementos que, à primeira vista, podem ser questionados em certos círculos cristãos, mas que funcionam como metáforas.

1. O Simbolismo do Dragão Benigno

Na teologia cristã, o Dragão é um símbolo recorrente de Satanás ou das forças do mal (notavelmente em Apocalipse). Contudo, em Ekrateia, os Dragões Originais são os pilares da criação e associados a virtudes.

  • Como Abordar: A autora opta por uma subversão intencional do símbolo. Em vez de representar o mal, o Dragão aqui é uma alegoria da Criação e dos Dons Divinos. Eles não são demônios, mas seres criados com características específicas (como o dragão da fidelidade ou da mansidão), apontando para a beleza da criação de Deus e para os dons que Ele distribui, removendo o estigma tradicional para servir à metáfora.
2. O Livro da Eternidade Fragmentado

O “Livro da Eternidade” (a analogia da Bíblia) é um artefato valioso guardado no templo que é roubado e fragmentado.

  • Como Abordar: A Bíblia Sagrada é imutável e sua Verdade é inquebrável, o que diverge da ideia de um artefato que pode ser roubado. A metáfora serve para realçar o perigo da verdade distorcida ou incompleta. O roubo dos fragmentos por Ardan, o rebelde, simboliza como a Verdade Original pode ser obscurecida por ideologias e rebeldias. A missão de Maila é, portanto, buscar a Verdade completa e restaurada.
Conclusão: Uma Jornada do Dever à Descoberta

“A Guardiã de Pedras” é uma obra rica para o leitor cristão que aprecia a fantasia, oferecendo mais do que entretenimento. A narrativa de Maila, que começa no aprisionamento do dever e da autojustiça, e a conduz a uma jornada de descoberta entre clãs e culturas diferentes, aponta para a necessidade de olhar além do nosso próprio sistema de crenças para encontrar a Verdade completa.

O livro convida à reflexão: o que acontece quando a busca pela perfeição (a Lei) nos separa da Graça e da verdadeira Unidade? É através da fantasia que a autora nos leva a questionar: o que realmente nos liberta do fardo de ter que ser impecável?

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